Após perder parte da perna no Afeganistão, marinheiro participa de simulações de conflitos para ajudar aos soldados e a si mesmo, na cura dos traumas psicológicos
Um marinheiro dos Estados Unidos tinha voltado da guerra há pouco mais de um ano quando seus amigos o convidaram para assistir um treinamento para as tropas que se preparavam para ir para a guerra. O exercício foi realizado em um estúdio de cinema, onde médicos e oficiais dos Fuzileiros Navais interpretavam missões de resgate durante a guerra com atores que tinham, na vida real, perdido membros em acidentes de motocicleta ou de carro ou para doenças como o câncer.
Os presentes não tinham certeza de como Joel Booth (foto) iria reagir. O marinheiro de 24 anos participou de um batalhão no Afeganistão como enfermeiro de combate – até que pisou em um explosivo e os médicos, há dois anos, amputaram sua perna direita abaixo do joelho. Desde que voltou para casa, teve que aprender a se adaptar e ao mesmo tempo lidar com o estresse pós-traumático.
Mas Booth ficou paralisado à medida que bombas falsas explodiam e os médicos praticavam os mesmos tipos de missões de resgate dos quais ele havia participado, salvando os atores amputados – que como ele, também tinham que ser salvos. Em seguida, o jovem veterano fez algo inesperado: pediu para participar de uma audição.
Talvez, pensou, esta lesão que tinha mudado sua vida para sempre poderia ajudar a salvar alguém. O que ele não sabia era o quanto reviver os horrores da guerra iria ajudá-lo. “Na sociedade, os amputados são vistos por pessoas em grande escala como tendo uma deficiência, como sendo mais fracos. Mas até mesmo alguém que não tem uma mão ainda pode operar uma arma para se defender”, disse. “É a mesma coisa para mim. Eu não tenho medo disso só porque algo ruim aconteceu comigo. Para as pessoas que não estiveram em combate, é difícil de entender.”
O produtor Stu Segall, mais conhecido pelo seriado de televisão “Silk Stalkings”, deu início ao projeto Strategic Operations ou (Operações Estratégicas, em tradução literal) em 2002 logo após o início da Guerra do Iraque (2003 – 2011) para oferecer aos militares o que ele chamou de treinamento “hiper-realista” ao utilizar efeitos especiais de filmes e atores.
O grupo já treinou centenas de milhares de soldados em cenas recriadas do Iraque, Afeganistão, Somália e outros pontos de acesso. Os criadores se esforçam para tornar as recriações mais parecidas possíveis com a experiência que vivenciariam na guerra para que os soldados possam primeiro se adaptar a situação em um ambiente controlado, e aprenderem a não serem intimidados por ele.
Booth entrou para os Fuzileiros Navais com 21 anos de idade, porque queria participar de combates e ajudar a salvar vidas. O trabalho de enfermeiro foi perfeito para ele, já que os médicos de campo eram encarregados pela prestação de cuidados de emergência para os soldados do campo de batalha e os enfermeiros muitas vezes precisam estar no meio da ação.
O ACIDENTE – Quase um ano depois de se alistar, ele foi enviado junto aos fuzileiros navais para o reduto do Taleban de Sangin, no Afeganistão. Em 21 de julho de 2011, enquanto participava de uma patrulha, ele e um fuzileiro se ofereceram para retornar à base para buscar suprimentos. Enquanto estavam caminhando, uma explosão fez com que Booth voasse longe e caísse de costas no chão.
Ele calmamente disse ao fuzileiro naval que o acompanhava para que verificasse se havia mais dispositivos explosivos improvisados atrás deles. Então ele olhou para sua perna. Não havia sangue, mas a dor era insuportável e Booth não conseguia levantar-se. Os ossos de seu tornozelo haviam sido esmagados.
Dois dias depois ele estava de volta aos Estados Unidos, onde passou por diversas cirurgias. Mas Booth não queria ser um paciente. Frustrado com cada operação que falhava e com o aumento de uma infecção, ele disse para que os médicos amputassem sua perna.
A DECISÃO DE AMPUTAR – No dia 29 de novembro de 2011, os médicos amputaram a perna direita de Booth. Ele recebeu sua prótese, e começou a fazer fisioterapia três vezes por semana para aprender a andar novamente. Mas Booth logo notou que seus ferimentos eram muito mais do que apenas físicos. Durante o dia, ficava à flor da pele. À noite, tinha pesadelos ou insônia. Ele começou a ver um psiquiatra, que lhe diagnosticou com estresse pós-traumático e lhe prescreveu medicamentos.
Booth vinha se perguntando sobre o que ele faria da sua vida quando alguns instrutores dos Fuzileiros Navais que estavam treinando jovens médicos o convidaram para o estúdio de cinema. Há quase um ano, Booth começou a trabalhar para o projeto Operações Estratégicas (foto). Ele já interpretou situações com o grupo uma dúzia de vezes, e não se incomoda com o sangue e os tiros. Pelo contrário, os exercícios têm o ajudado a lidar com seu estresse pós-traumático.
Profissionais de saúde mental, disseram não estarem surpresos que Booth tenha sido auxiliado por sua experiência com o projeto. “Para muitos desses caras, não tem como ficar melhor do que isso – ser capaz de saber que você está fazendo a diferença na vida das pessoas que ainda estão em combate”, disse Nancy Commisso, terapeuta do grupo Easter Seals. “Nenhum desses caras querem ser o paciente – especialmente socorristas que tendem a simbolizar força e ser alguém que quer ajudar.”
No início do ano, o Operações Estratégicas aceitou seu segundo veterano no grupo: Redmond Ramos, outro socorrista amputado que Booth conheceu quando ambos estavam se recuperando no hospital. Em uma manhã fria, mas ensolarada no estúdio, no mês passado, sirenes estridentes ocupavam o local à medida que a fumaça de um acidente de helicóptero rodeava os atores. Um manequim ensanguentado sem pernas estava pendurado para fora do helicóptero.
Booth sentou-se sob o suporte, inclinando-se contra a aeronave. Ele sacudiu a perna amputada para que parecesse que estivesse tremendo. Alguns fuzileiros navais se aproximavam dele, esquivando-se ao estilo de tiros à medida que Booth gritava: “Ajude-me!” Um dos participantes se atrapalhou enquanto se apressava para colocar um torniquete e curativo. Então, ele ergueu Booth por cima de seu ombro e correu através das explosões. Esta seria uma das inúmeras vezes durante o dia em que Booth seria resgatado.
Por Julie Watson
Fonte: Último Segundo / Via Agência AP
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Passo Firme – 11/04/2013
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